Por: Bohatch Jr, MS
INTRODUÇÃO
As discrasias plamocitárias são neoplasias monoclonais que tem origem em células progenitoras de linfócitos B, com características de proliferação incontrolada e produção de anticorpos com síntese e secreção de gama-globulinas (componente M ou Proteína M) e/ou subunidades polipeptídicas, denominadas de Proteínas de Bence Jones (PBJ). Dentre as discrasias plasmocitárias, o Mieloma Múltiplo (MM) é a patologia mais comum e é responsável por alta morbidade e mortalidade. Trata-se de uma doença progressiva e fatal caracterizada pela proliferação de plasmócitos malignos (ou plasmoblastos) na medula óssea.
A incidência de MM na Europa é de 6/100.000/ano com uma média de idade no momento do diagnóstico entre 63-70 anos e uma taxa de mortalidade de 4/100.000/ano. Nos EUA a incidência é de 3-4/100.000/ano, afetando 70.000 pessoas, com 15.000 novos casos por ano e com uma porcentagem de mortes causadas pela doença entre 1 a 2%. É considerada a 2ª neoplasia hematológica mais comum após os linfomas, apresentando uma distribuição distinta entre os grupos étnicos. Em caucasianos, o MM representa cerca de 1% do total de cânceres e 13% de todos os cânceres hematológicos; já em afrodescendentes, representa cerca de 2% do total de cânceres e 33% do total de cânceres hematológicos.
A doença manifesta-se de forma agressiva com sintomas pronunciados e uma substancial redução da qualidade de vida. Aproximadamente, 80% dos pacientes apresentam destruição osteolítica, 73% apresentam anemia no diagnóstico e 30% dos pacientes apresentam insuficiência renal. A deterioração da função imunológica também é uma característica importante da doença e leva a graves infecções.
O tratamento da MM evoluiu substancialmente nos últimos anos, prolongando a sobrevida global após a introdução de altas doses de quimioterapia combinada com transplante autólogo de células-tronco, além do uso de agentes como talidomida, bortezomibe e lenalidomida. Apesar dos avanços terapêuticos, o tratamento ainda é limitado e paliativo, com uma taxa de sobrevida relativa em 5 anos de 35-37% em doentes recém-diagnosticados com MM.
CARACTERÍSTICAS DA DOENÇA:
Etiologia
A causa do MM ainda é desconhecida, acredita-se que ocorra um erro nos mecanismos de modificação do DNA de células B, como a translocação de genes de imunoglobulinas (Ig), hipermutação somática ou recombinação VDJ. Essas translocações desregulam ou aumentam a expressão de oncogenes, tendo como resultado a formação de uma célula em estágio pré-plasmocitário que migra para a medula óssea, onde se fixa por meio de proteínas de adesão (ex.: integrinas) e se diferencia em plasmócitos malignos que se expandem e se acumulam na medula. (ver artigo: “Interações entre o Microambiente Tumoral e o Mieloma Múltiplo”)
Há estudos tentando associar o Herpes Vírus Humano (HHV-8) com o MM baseado na evidência que o HHV-8 aparece com alta incidência em pacientes com MM e em alguns pacientes com Gamopatia Monoclonal de Significado Indeterminado (GMSI). Nessa hipótese, células dendríticas infectadas pelo HHV-8 na medula secretariam produtos virais semelhantes a fatores de crescimento, como interleucina-6 viral (v-IL-6), v-MIP-I e v-MIP-II. Dessa forma, ocorreria um efeito parácrino, levando ao desenvolvimento de uma população monoclonal de plasmócitos, além de torná-los mais susceptíveis a outras alterações genéticas.
A utilização de técnicas de citogenética molecular (hibridização in situ fluorescente – FISH) e de biologia molecular (reação em cadeia da polimerase – PCR, hibridização genômica comparativa baseada em microarranjos – aCGH e microarranjos de RNA) estão ajudando a esclarecer o campo obscuro que é a patogênese do MM, além de auxiliar nas medidas terapêuticas pelo descobrimento de marcadores biológicos importantes como fatores prognósticos (Quadro 1).
Quadro 1. Alterações genéticas e citogenéticas do Mieloma Múltiplo.
Fonte: https://blog.medportal.com.br/hematologia/caracteristicas-fisiopatologicas-do-mieloma-multiplo-parte-i/